Rick and Morty (T3): I’m Pickle Riiiiick!

O texto que se segue CONTÉM SPOILERS

Rick, Morty e companhia regressaram para uma nova fornada de episódios que continuamente relembram o espectador de que nada importa. Seres que nada são por entre a teia de um tempo e espaço infinitos. Ao fim de três temporadas, tamanha máxima deveria ainda receber tão preponderante destaque?

aqui salientei o dito apregoar da série como apresentando um certo desgaste na constante de ser motivo narrativo. Sendo essa “lei” cósmica directriz a “Rick and Morty”, não deveria haver uma preocupação em exibi-la tão regularmente nas palavras do próprio Rick. Vê-se subentendido a cada novo episódio, mediante o reduzido valor dado à vida humana naquela e numa qualquer outra realidade alternativa. Os actos de um Rick que nem sequer pestaneja ao tirar uma vida, deveriam falar por si só, ser espelho à máxima da série. É certo que aí se contém muito do ADN de “Rick and Morty”, mas três temporadas depois há que saber explorar uma outra dinâmica. Cada acto tido por estas personagens importa, ou pelo menos assim o deveria ser. Tomando como exemplo o episódio da segunda temporada “Look Who’s Purging Now”, transparece neste uma dose saudável de dúvida. Morty é ou não capaz de matar alguém? No final do episódio sente-se uma metamorfose para a personagem, tendo como força motriz a escolha. A recorrência de Rick ao rótulo de que nada importa, não só trai a possibilidade de evolução das personagens como acaba por tingir um pouco a nossa “empatia” para com as mesmas. Até que ponto pode a nossa empatia ser parte activa, quando existem mil e um substitutos prontos a substituir estes arquétipos de personagens? A ideia das infindáveis realidades alternativas é magnífico pilar à série, mas a longo prazo pode vir a prejudicar a relação que se estabelece entre espectador e personagem.

À semelhança do imutável Frank Gallagher em “Shameless”, o narcisismo de Rick revela-se entrave a um crescimento mais profundo, colocando a personagem num círculo vicioso. No passado deram-se vislumbres de evolução, a sua tentativa de suicídio como exemplo que assalta a memória, que acabam por se revelar inconsequentes e incapazes de mexer com o núcleo da personagem.

Aparte a reciclagem temática e um ou outro episódio menos conseguido (o segundo a la “Mad Max” e aquele que encerra a temporada), “Rick and Morty” continua a maravilhar com a sua veia criativa única no panorama televisivo actual. “Pickle Rick” dispensa qualquer apresentação, chegando até mesmo a ser referenciado pelo indivíduo alheio à série. Episódio que tem todos os ingredientes para se vir a tornar objecto de culto com o passar dos anos. Debaixo da sua carapaça excêntrica houve espaço para um drama mais intimista e terra-a-terra, assente na dinâmica entre pai e filha. Desde o início da série que Rick se mostra influência nefasta para a filha, objecto de adulação cega. A relação instável entre ambos, bebe do receio que Beth sente em poder ser novamente abandonada pelo pai. É essa a base para o jogo de cedências debaixo daquele tecto, chegando até mesmo a destruir o casamento de Beth. Necessidade constante desta se provar diante do pai, de obter a sua admiração. O penúltimo episódio viria quase a funcionar como sequela a “Pickle Rick” pela forma como aborda o laço familiar entre as duas personagens. Beth toma consciência do narcisismo que os interliga. É essa postura individualista que a leva a ponderar a proposta do pai, janela aberta à fuga. Nunca se saberá realmente se optou ou não pela via de escape. Tratando-se da Beth “original”, pode então dizer-se que o final de temporada lhe é palco a catarse. Escolhe o marido e os filhos em detrimento de Rick.

O divórcio dos Smith é fruto dessa dinâmica narcisista entre pai e filha. Arco narrativo prolongado que dá à temporada uma sensação de princípio, meio e fim. Motivo que afasta Jerry das restantes personagens e lhe retira considerável tempo de antena. E não é essa decisão feita à imagem da mais rejeitada das personagens? O seu reduzido tempo de antena não foi parco no memorável. Naquele que é um dos melhores episódios da série, Jerry tem em mãos a possibilidade de se ver livre de Rick para sempre. Maravilhoso pedaço televisivo que faz uso de uma dupla improvável para discutir os interesses em jogo. A terceira temporada é exímia na medida em que consegue abordar todas as problemáticas entrecruzadas. Houve até mesmo tempo e espaço para se atentar às sequelas de Rick e Morty provocadas pelas infindáveis viagens interplanetárias. “Morty’s Mind Blowers” é engenhoso na forma como traz para a mesa os traumas alheios ao olhar do espectador. Nada é deixado ao acaso numa série que podia perfeitamente optar por caracterizar o seu universo em detrimento de uma maior caracterização das suas personagens. Sem nunca incorrer no desleixo das personagens, a expansão do universo criado continua a receber a devida atenção. “The Ricklantis Mixup” tem tudo para poder ser celebrado como um dos colossos de 2017. Primeiro a tirar de cena os originais Rick e Morty, fica relembrado como amálgama de referências e homenagens. Sobe ao trono Donald Trump…perdão, Evil Morty. A haver quarta temporada, espera-se um retorno a este motivo narrativo momentaneamente suspenso. Um Morty no poder é ouro narrativo, capaz de vir a agitar os alicerces de “Rick and Morty”.

Confessem, olhar para um frasco de pickles adquiriu outro significado.

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