“Peaky Blinders” despede-se da temporada. “Shameless” pisca o olho à perdição de uma personagem.
Peaky Blinders: 4×05 – The Duel
O confronto entre as duas frentes de guerra abre o episódio em todo o seu esplendor. Belíssima a violência física conseguida em “Peaky Blinders”. Para um tão esperado frente-a-frente, desilude na parca interacção entre Tommy e Luca. A polícia interrompe-os em pleno clímax, num timing demasiado conveniente que adia a resolução para o episódio seguinte. As promessas de início de temporada foram demasiado megalómanas no anúncio de mortes em catadupa. Sofre um pouco no seu curso por não ter “gado” para eliminar.
Tommy Shelby é indubitavelmente uma das melhores personagens de 2017, em contínua caracterização por cada minuto em cena. É na individualidade, no privado acesso do espectador, que se pontua o vazio da personagem. Grace ausente mas sempre presente, lembrança da felicidade como efémera. Tommy olha ocasionalmente para a moldura que a mantém acesa na memória, num misto de saudade e vergonha (?) por a desiludir continuamente.
Ao ouvir a notícia de que irá ser novamente pai, vislumbra-se um pouco da sua fragilidade. Rapidamente se metamorfoseia pela via dos negócios. Transferências feitas mensalmente através da empresa, aí começa e termina a sua postura como pai. Lizzie terá de colocar as suas idealizações de lado, contentando-se com um Tommy somente presente pelo dinheiro. Sina das personagens de “Peaky Blinders”, tidas no limbo de um meio-termo que transparece felicidade mas que em nada lhes preenche o vazio.
Peaky Blinders: 4×06 – The Company
Fim da linha para uma excelente temporada que pecou na promessa de sangue a rojo. Soube introduzir e trabalhar um vilão à altura, interpretado por um Adrien Brody a merecer todo e qualquer elogio que lhe caia no colo, mas fê-lo proferir demasiadas palavras de ameaça que nunca chegariam ao acto. A recta final revela-se assim um pouco aquém para expectativas demasiado elevadas.
Talvez passe pelo cansaço somente de quem vos escreve e não tanto de uma narrativa que se tem continuamente provado de excelência, mas algo falhou nos dois últimos episódios da temporada. Amálgama ininterrupta de falsas aparências, lealdade de levantar sobrolho, que prejudicaram a envolvência do espectador.
Não só se tolda a vista a Luca Changretta e companhia, mas também ao espectador, ainda que dificilmente se fossem ver livres de um tão preponderante Arthur Shelby. O regresso da personagem é misto de alívio e desilusão. Um final feliz, mediante aquilo que o termo significa numa série como “Peaky Blinders”, que contraria em muito aquilo que se vinha a desenhar no curso da temporada.
“The Company” propôs-se a demasiado numa duração comedida. A entrega de Tommy à loucura no decorrer das suas férias, merecia mais tempo de antena para ser melhor explorada. Ainda assim, soube pavimentar a próxima temporada. Uma ascensão ao poder que continua a saber encontrar novas vias de interesse.
A série regressa somente em 2019. Nada mais para além de aguardar. By order of the Peaky fucking Blinders.
Shameless: 8×06 – Icarus Fell And Rusty Ate Him
Numa temporada que gere o tempo de antena de todas as personagens numa dose mais ou menos certeira, Fiona continua a clamar pela atenção máxima. Há crescimento saudável a ser retirado do seu percurso actual e “Shameless” tem vindo a dar bom uso à aprendizagem gradual da personagem. E quão criminosa a ausência total de Emmy Rossum na corrida aos prémios, ano após ano? Uma das interpretações mais subvalorizadas do panorama televisivo, eternamente condenada à sombra do galardoado William H. Macy.
A morte da inquilina insinua-se na rotina de Fiona como prenúncio daquele que pode vir a ser o seu próprio fim. Dura a realização de poder envelhecer sozinha, esquecida ainda muito antes da morte. Por cada nova relação amorosa de Fiona, paira sempre o receio que de que esta possa vir a regredir na evolução conseguida nos últimos anos. Talvez esteja na altura de um equilíbrio saudável entre vida profissional e amorosa, renegando a prevalência de um em detrimento do outro.
Para um episódio em seguimento directo à explosão entre Fiona e Ian (Find another fucking church.), optou-se por uma abordagem mais leve que obscurece quase por completo a nova dinâmica entre ambos. Desleixo que se tem vindo a repetir uma e outra vez no curso da temporada, suspendendo arcos narrativos em pleno ponto de ebulição.
Shameless: 8×07 – Occupy Fiona
Clara melhoria face aos episódios das últimas semanas, “Occupy Fiona” resvala para o pólo dramático que tão bem catapulta “Shameless” na qualidade. É ainda uma das melhores séries a saber confluir géneros tão opostos. A nível pessoal, as melhores memórias deixadas pela série cabem no drama. Talvez por isso mesmo ainda retenha a quarta temporada como a melhor até à data.
O episódio a abrir a segunda metade da temporada chega com um ligeiro atraso. Apresenta-se aquando da quebra sentida no curso do episódio anterior, esse salto que havia colocado de molho o confronto entre os irmãos Gallagher. É quase inevitável a tomada de partido do próprio espectador na guerra aberta que se vinha a desenrolar e que agora finda. Há muito que Fiona se tornou a voz da razão, usando o passado como lembrança constante e catapulta a uma nova tentativa de existir na sociedade. Ao tomar tamanha posição, ver-se-á inevitavelmente odiada e rotulada como “cabra capitalista”. A verdade é que a própria postura de Ian, diametralmente oposta, pouco ou nada tem de puro nas intenções. As suas palavras activistas não são mais resgatadas da boca do interesse amoroso, como forma a reconquistá-lo.
O olhar dormente na recta final do episódio pisca o olho ao regresso do Ian que marcara a quinta temporada. Esperada de tão natural que é, esta sua nova entrega à doença virá a quebrar com aquilo que viera a construir para si mesmo. Na ausência de Monica, a única a compartilhar da sua doença, e de Mickey, aquele que melhor o acompanhava, é queda orgânica na narrativa. Belíssima a cena compartilhada entre os irmãos, nem que seja pela escolha da música que a ambienta. Um emparelhar de personagens muitíssimo bem conseguido, raro na sua frequência, que não merece ser largado agora.
Alheios ao confronto com sangue Gallagher, elevaram-se no interesse outros arcos narrativos até então bastante pobres. Lip apercebe-se de que não pode pressionar ninguém a largar o vício, ainda mais ao demonstrar-se dependente da não dependência de terceiros. Um dos episódios que melhor ilustra o excelente actor que é Jeremy Allen White. No seu rosto lêem-se sentimentos que vão desde a desilusão que agora nutre pelos seus mentores, ao desespero de não incorrer em semelhante perdição.
No campo da comédia sem pudor, V e Kev relembram-nos o porquê de já terem sido duas das melhores personagens no historial da série. Na ausência de Svetlana, tudo funciona de forma orgânica. As piadas não chafurdam no forçado e a tremenda química entre ambos é sempre um trunfo. Há muito que se anda num loop no que diz respeito a este trio e a ausência temporária de Svetlana como factor benéfico para a narrativa só vem a comprová-lo.