Black Mirror: 4×04 – Hang the DJ (Netflix)

O texto que se segue CONTÉM SPOILERS.

À semelhança do aclamado “San Junipero”, esse consensual episódio que inovou no tom da série, volta a fazer-se uso do amor como tema maior no quarto tomo da temporada. Desbrava-se a tecnologia como castradora desse elo genuíno tão utópico na distopia de “Black Mirror”.

Na era do “consentimento hollywoodesco”, “Hang the DJ” usa a tecnologia como firme resposta. Consentes? Carrega no botão. Apresenta um mundo formatado na óptica do emparelhamento perfeito. Rejeitam-se as infindáveis possibilidades de escolha, aqui teorizadas como base a uma insatisfação perpétua, e traz-se a obrigação para o jogo que é a busca do par ideal. O olho do “Grande Irmão” sempre vigilante, pronto a redireccionar cada tentativa de fuga de volta ao curso que a norma dita. Relação atrás de relação, seja esta duradoura ou veículo casual para meras horas, constroem-se os perfis de ambos os protagonistas. Como reagem nesta e naquela situação, migalhas ao estudo da postura num relacionamento. Aplicação questionável no pré-aviso da duração, podendo assim provocar nos participantes um certo desleixo. Ao conhecer-se-lhe a meta, torna-se difícil uma maior dedicação na relação imposta. Até mesmo o passo de viver com a outra pessoa é dado de imediato, como que ponto de partida característico de um qualquer reality-show que provoca a ebulição do casal. Mostrando-se aplicação duvidosa, peca ainda na ausência de quaisquer intervalos por entre relacionamentos, não permitindo tempo e espaço para um sarar de feridas e a possibilidade de se existir a solo.

A ser emparelhado no cenário televisivo de 2017, “Hang the DJ” casa com “First Date” de “Master of None”. Ambos se propõem a ser estudo à busca do amor por via da tecnologia, interacções em catadupa que fazem do indivíduo mancha disforme e impessoal. Ainda que no caso de “Master of None” o cenário seja mais terra-a-terra e reconhecível, ao olharem para lá da azáfama dos encontros, ambos os episódios funcionam de igual forma como postal à solidão. A dada altura, Amy (uma magnetizante Georgina Campbell) observa o desfilar de casos de uma só noite que desfilam na sua cama. Imóvel, dormente à fugacidade dos corpos que lhe preenchem os dias. Ao passar da superficialidade do primeiro encontro, “Hang the DJ” vai mais longe no estudo a que se propõe. Acerca-se dos pequeninos trejeitos que gradualmente adquirem maior peso num relacionamento e o corroem com o tempo. Quão hilariante o culminar do sexo oral com o som característico do par de Amy? “Black Mirror” livra-se do negrume que lhe é constante, do pessimismo como ordem natural, e entrega um episódio bem mais leve com laivos de um humor descontraído. Um pedido com ar aborrecido, em pleno acto sexual: Bit faster? More motion.

A rebelião contra o sistema, uma e outra vez, chega como a derradeira resposta para a compatibilidade de ambos, já do outro lado do espelho. 99.8 %. São bem mais que percentagem. A química que os interliga é de louvar. Não vive somente da urgência do sexo, transparecendo quase palpável até mesmo numa troca de ideias. Elevam cada instante do episódio.

Da intenção à execução, nada deturpa a visão de “Hang the DJ”, que entra para o currículo de “Black Mirror” como um dos mais completos episódios. Pedaço televisivo alvo do mais puro deslumbre. Sorriso no rosto que tão cedo não esmorece.

2 opiniões sobre “Black Mirror: 4×04 – Hang the DJ (Netflix)”

    1. Não achei a temporada nada fraca (com excepção para “Arkangel”), mas é também o meu preferido. Logo seguido por USS Callister e Metalhead.

      E sim, que bela música para encerrar o episódio 🙂

      Gostar

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