A mais recente aposta do Netflix em termos de produção própria (literalmente e não daquelas em que eles colocam o rótulo em cima) parece contar-se como uma das menos consensuais. E há legitimidade nessa divisão, que vai para além de uma questão de gosto.
Baseada na obra homónima de Richard K. Morgan, “Altered Carbon” traz de novo à ribalta o género ciberpunk (onde “Do Androids Dream of Electric Sheep?” e a sua adaptação ao cinema, intitulada “Blade Runner”, se contam como das obras mais influentes), transportando-nos para um futuro onde desenvolvimentos tecnológicos tornaram real o objectivo mais almejado pela raça humana, a (quase) imortalidade, mas os quais não foram aproveitados para melhorar as condições sociais. Pelo contrário, apesar da “vida eterna”, a ganância dos poderosos é mais acentuada que nunca e o desespero dos fracos e oprimidos continua a marcar o seu dia-a-dia, perpetuando um calvário que lhes parece destinado.
Esta realidade ficcional é detalhada ao pormenor, fazendo da história uma narrativa intrincada, a qual série não facilita em termos da sua exposição. São precisos vários episódios, bem como alguma atenção, para perceber terminologias e procedimentos, para se desfrutar na plenitude do mundo criado por Morgan. Mas é na desconstrução deste novo mundo que reside a maior força da série.
Graças a efeitos especiais que nem sempre estão ao alcance dos orçamentos existentes para ficção televisiva e a um guionismo atento ao material original, a série é bastante eficaz no que diz respeito à criação do contexto. O escrutínio das implicações ideológicas, bem como das ramificações sociais e culturais, são incisivas e convidam à reflexão. Peca, contudo, por paralelamente se assentar numa trama policial desmotivada ou, pelo menos, sem grandes ambições. Por vezes aborrecida, outras previsível, sente-se como um peso extra dispensável, retirando energia a tudo o resto.
Com a maioria do orçamento gasto em efeitos (e em cenas passadas no duche), nota-se ainda a fragilidade do elenco. Há uma clara atenção quanto à diversidade, mas sente-se uma aposta falhada em algumas escolhas. Joel Kinnaman, cuja afirmação em Hollywood está no bom caminho, destaca-se do resto. James Purefoy, Kristin Lehman e Dichen Lachman cumprem, mas não deslumbram. O Poe de Chris Conner é uma agradável surpresa. Mas Martha Higareda é uma escolha dúbia para co-protagonista. Pedia-se outro perfil para um papel tão relevante.
É inegável que “Altered Carbon” assume as suas pretensões, construindo com eficácia a sua realidade, oferecendo um contexto estruturado e credível, mas acaba por perder peso na balança quando facilita em termos narrativos, deixando-se arrastar numa trama banal que raramente explora todas as potencialidades desta história.
Só vi o primeiro ep. Já li duas muito boas críticas e uma má. Vamos ver.
O primeiro ep não foi nada de extraordinário mas o tema é interessante.
Falhou uma coisa neste primeiro ep que, quero acreditar, irá ser esclarecido ao longo da série: perceber, cronologicamente, em que ponto estamos. Pelas minhas contas será algo como +- 600 anos no futuro. Parece-me pouco para a exploração espacial que nos é mencionada.
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São 300 anos, se não me engano.
Mas é a exploração espacial que te faz impressão? Ter um dispositivo implantado à nascença que armazena a tua consciência e a permite transferir de corpo para corpo, dando-te “imortalidade” não?
Se no Século VII andavas de burro e era para aqueles que tinham sorte, não me parece despropositado 😛
Seja como for, é ficção científica.
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ZB, acho essa evolução perfeitamente natural e acho que em 100 anos teremos muitas novidades nesse campo. Já conseguir chegar a outros planetas e colonizá-los como nos foi mostrado neste primeiro episódio parece-me algo demasiado evoluído mesmo tendo em conta todos os avanços que irão ocorrer em 600 anos (ou 300, ainda pior).
A ideia com que fiquei é que o Joel acorda 300 anos depois de ter sido “morto”. E que cronologicamente o tempo em que ele é morto é cerca de 300 anos à nossa frente. Mas ainda só vi o primeiro ep…esta é daquelas que tenho de ver com a patroa e não está fácil. 🙂
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Os 300 anos é o que vem na sinopse da série. Não me lembro ao certo, mas basta rever para confirmar.
Eu tenho uma abordagem diferente por duas razões:
1) estamos a falar de ficção. escrever ficção científica não implica necessariamente que um autor faça uma pesquisa exaustiva sobre em que grau de desenvolvimento se encontram determinadas investigações/desenvolvimentos científicos. Até porque a investigação científica nem sempre é algo linear (ao investigar uma coisa acaba por se descobrir outra), é incerta (não há prazos para descobrir algo) ou, alguma, até é do desconhecimento público (o que não faltarão são projectos russos e chineses nas mais variadas áreas que são do total desconhecimento da comunidade científica, quanto mais do público). Isto para dizer que uma história de ficção científica é um exercício teórico, onde tu pegas em determinados pressupostos reais (a parte científica) e lhe dás o teu cunho pessoal (a parte da ficção da coisa).
2) para mim, as viagens espaciais e consequente colonização de outros planetas (e têm sido descobertos cada vez mais, e mais próximos do que julgávamos) parecem-me mais viáveis em 300 anos do que a transferência total da consciência humana para um dispositivo. Ainda estamos agora a dar os primeiros passos no que toca a inteligência artificial, quanto mais… Dentro daquilo que percebo sobre o assunto, que é praticamente zero, acho que estamos a falar de um volume de informação de proporções tremendas, que não será de fácil armazenamento e muito menos de fácil conexão/assimilação (ainda para mais por corpos orgânicos e não mecânicos). É que quase que parece que estamos a falar de uma pen usb com dados (consciência) que é conectada no computador que se quiser (corpo)… mas não estamos…
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A IA vai avançar muito mais rapidamente do que a capacidade de exploração espacial. Não tenhas qualquer dúvida. Em meados de 2030/40 a IA será mais inteligente que o ser humano. E se tiverem em conta que a evolução tecnológica duplica a cada dois anos a capacidade de processamento então imagina como será a IA quando dois anos depois de atingir o ponto humano tiver o dobro da inteligência. E a cada dois anos duplica. (aliás, são 18 meses).
Mas percebo tudo o que disseste e tens toda a razão. Eu é que tenho esta pequena pancada de procurar lógica mesmo na ficção…pelo menos neste tipo de ficção que, supostamente, é “real”.
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Até pode ser que sim, mas uma inteligência artificial, criada para responder de acordo com determinada programação, e transferir a consciência humana com toda a sua complexidade para um dispositivo está longe de ser a mesma coisa. É que a complexidade de uma personalidade vai muito além da inteligência.
Mas a questão é que a lógica que procuras é de certo modo falaciosa, porque parte do pressuposto daquilo que tu achas que deverá ou não vir a ser real, por mais bem estudada que tenhas a questão, e não daquilo que pode realmente vir a ser a real, que está dependente de uma multiplicidade de circunstâncias… Imagina que amanhã ocorre um cataclismo qualquer… Todos os avanços que tu prevês existirem daqui a 50 anos deixam de ser possíveis. A não ser que sejas descendente do Bandarra e saibas aí alguma coisa que nós não 😛
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Ainda só vi dois episódios, e muito embora os efeitos especiais estejam bons, as prestações do elenco deixam muito a desejar. Não me cativou, confesso.
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Vi 6 episódios e estou a gostar, embora seja um pouco parada pro vezes….
O melhor efeitos especial, as cenas de sexo e violência e a ideia subjacente.
O pior demasiado tempo para enquadrar a historia…
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