Westworld: 2×09 – Vanishing Point (HBO)

O texto que se segue CONTÉM SPOILERS

Na penúltima hora televisiva de uma temporada duvidosa, aprofunda-se o negrume de William. Caracterização necessária ou mero traduzir em imagens daquilo que já fora dito incontáveis vezes no curso da série?

Desde o episódio-piloto que se vem a construir a personagem em crescendo, colateral de uma jornada de autoconhecimento alheia às amarras morais. Do branco ao negro, do sadismo ao fardo da culpa. Por mais interessante que William seja, sente-se agora uma certa dormência narrativa fruto de um percurso que não olha a desvios. Ou melhor, um percurso que o próprio não contesta, mas que é constantemente interrompido por forças que lhe fogem do controlo. Não fosse a caracterização em paralelo do William pré-Westworld, e notar-se-ia de forma ainda mais evidente essa estagnação que toma conta da personagem de Ed Harris no presente. Havia realmente necessidade de se recuar ao passado com o espectador ao colo, para que este testemunhe pelos seus próprios olhos aquilo que já fora contado e recontado inúmeras vezes? Não. É certo que se introduz a novidade de um cartão com o perfil de William, mas tal acaba por contar mais sobre a importância de Ford (Anthony Hopkins) no seu percurso do que acrescentar algo preponderante que leve a uma maior compreensão do suicídio. O facto da mulher de William conseguir vê-lo para lá da carapaça, deveria poder ser motivo narrativo forte o suficiente. Tratam-se de experiências graduais no seio de um casamento, propensas ao privado, que não se deveriam confundir com esta omnipresença de um todo-poderoso Ford. Ao invés, tudo tem de ficar demasiado claro, com motivo demarcado que em nada surpreende, sem espaço para as entrelinhas. Se por um lado é indiscutível que a confirmação é bem mais dolorosa que possíveis especulações, por outro retira força a alguém que conseguira ver William por aquilo que realmente é.

If you keep pretending, you’re not gonna remember who you are.

Sabendo que a sua mulher comete suicídio na mesma noite em que guarda o dito cartão, não lhe ocorre correlacionar causa e efeito? Decorrem vários anos e nunca lhe ocorre confirmar se o cartão ainda está dentro do livro tal como o deixara? Uma peça frágil que conduz de forma conveniente ao fim trágico entre pai e filha. Agora sim, um William como expoente máximo do niilismo, sem nada a perder e sem nada que ainda lhe importe. Uma pena que Emily (Katja Herbers) tenha servido somente como prova e catapulta de perdição. Havia potencial para se vir a tornar numa personagem por si só interessante. Num episódio essencialmente sobre William, é nesse foco que se perde a maior fatia de interesse. Mero recontar por outras palavras e com timbre de voz poético. Ainda assim, belíssimo o momento em que se automutila para confirmar a sua origem. A ínfima possibilidade de que nenhuma das escolhas que o conduziram até ali fossem efectivamente escolhas.

“Vanishing Point” serve um outro propósito, o de estabelecer um paralelismo entre a condição actual de William e Dolores (Evan Rachel Wood), qual ironia trágica. Em ambos os casos, a cara-metade acaba por ceifar a própria vida como fuga ao vilão que tem diante de si. Fechando os olhos à caricatura em que Dolores se tornou no curso da temporada – não havendo uma evolução orgânica e mais subtil, que em muito contraria a gradual caracterização conseguida na temporada anterior -, há a destacar pela positiva o arco narrativo que a interliga a Teddy (James Marsden). No curso de nove episódios deu-se uma progressão narrativa pouco vista nos restantes arcos que conduzem a temporada. Dolores molda o seu amante a bel-prazer, apagando-lhe a inocência e bondade que outrora foram traços de carácter compartilhados por ambos. A troca de palavras abaixo transcritas ilustram uma certa segurança no amor como a constante por entre mudanças e updates.

Teddy: We were so in love.

Dolores: We still are. Aren’t we?

O desfecho que Teddy escolhe para si mesmo é a liberdade de escolha que Dolores tanto apregoa. O premir do gatilho como fuga a um elo de ligação que lhe provoca a condição de vilão. Não chegando a ser uma surpresa para o espectador, dada a revelação do cadáver de Teddy no primeiro episódio, é ainda assim um autêntico choque quando visto pelos olhos de Dolores. Um game-changer no historial de “Westworld” e na metamorfose iminente de Dolores. Carrega agora um fardo em tudo semelhante ao de William. O tão aguardado reencontro a dar-se no último episódio da temporada?

Of all the hosts I made…you, Maeve, were my favorite.

Anthony Hopkins deixa transparecer na sua personagem uma fragilidade até então ausente. A sua voz falha momentaneamente e denuncia Maeve (Thandie Newton) como a sua criação preferida. O beijo na testa a colocar Maeve de novo em jogo.

“Westworld” parte para a última hora de 2018 com a promessa hercúlea de um convergir de personagens e motivos. Um só local como palco a uma despedida que pode ainda conseguir tirar a temporada do marasmo que lhe foi característico. A porta como ponto de fuga.

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