Com largas centenas de séries televisivas produzidas anualmente (o Presidente do FX até apresentou um relatório em que revelou que, só nos EUA, foram 487 em 2017), vivemos numa época em que ter uma série baseada num filme que, por sua vez, é baseado num livro é algo normal. “Condor”, produzida pela Paramount, MGM e Skydance, e exibida no AT&T, é a série em questão.
Pegando no filme de Sydney Pollack (“Three Days of the Condor”) e no livro de James Grady (“Six Days of the Condor”), o trio de criativos Todd Katzberg, Ken Robinson, Jason Smilovic tinha o complicado desafio de trazer ao pequeno ecrã um thriller de conspiração política bastante conceituado (que por vezes se vai apanhando na grelha de programação de canais nacionais, sobretudo no FOX Movies), que se conta para muitos entre os melhores saídos de Hollywood e que é protagonizado por duas referências da Sétima Arte, sobretudo entre as décadas de 60 e 90, mas cujo impacto na história do cinema permanecerá intacto pela eternidade. Falo, pois claro, de Robert Redford e Faye Dunaway.
Mais do que isso, do que fazer jus ao material que lhes serve de inspiração, aceitaram a missão de transportar a história para a actualidade de forma credível, o que não se revelaria muito complicado dado o conturbado período geopolítico actual. O cenário escolhido é o inevitável para os dias de hoje, o do confronto entre o mundo ocidental e o mundo islâmico, ou, pelo menos, uma facção mais extremista deste. A ficção tende a acompanhar os tempos. Não é difícil identificar os nazis e os russos/soviéticos como os vilões favoritos de Hollywood durante várias décadas, reflexo dos conflitos doutros tempos. A diferença aqui, porque “Condor” é um thriller de conspiração política, reside na opção em olhar para dentro, perceber que os justos e dignos talvez não o sejam, perceber que há quem puxa os cordelinhos sob um falso pretexto da defesa da liberdade e admitir que, talvez, aqueles a quem distinguimos como heróis provavelmente não o sejam. Mais do que isso, é no sentimento de perda que tal traição potencia, pela quebra de confiança no sistema, através de actos e respectivas consequências com impacto a nível pessoal e organizacional, que reside a força da série. E, para isso, contribui um leque de personagens bem exploradas na sua dor.
É verdade que o galante Joe Turner de Redford, que bebe directamente do carisma do actor, se transforma numa versão muito mais física, mais prática mas menos elegante e sedutora, mais ao nível do protagonismo possível proporcionado pelo pouco calejado Max Irons, que por vezes tem alguma dificuldade em esconder algumas das suas limitações, mas o rol de secundários, alguns com nome feito (William Hurt, Mira Sorvino, Bob Balaban, Brendan Fraser), são exímios e rapidamente se revelam a grande força da série. Não só pelo desempenho dos actores na sua generalidade (e aos nomes acima juntaria Kristoffer Polaha, Kristen Hager, Christina Marie Moses, Katherine Cunningham, Angel Bonanni e, sobretudo, Leem Lubany), mas pela oportunidade de desenvolvimento que os criadores/argumentistas concedem às personagens.
Se há algo que o formato televisivo possibilita à ficção é dar a um grande número de personagens secundárias uma vitalidade que num formato de curta duração raramente têm (no cinema há tempo para uma ou duas, nunca para dez e nunca com o tempo que eventualmente mereceriam). Não descurando a causa (o terrorismo; o acto), é no efeito (as consequências) que “Condor” se eleva, uma vez que não demonstra receio na altura de sobrecarregar as suas personagens com o peso da dor provocada pela perda. Focando-se nesse aspecto, a série ganha outra dimensão.
Sem se tornar refém da acção, doseando a sua adrenalina, com um aceitável argumento no que toca à conspiração política (se bem que o último episódio revelou algumas fragilidades neste aspecto), uma vilã memorável (o Joubert de Max von Sydow tornou-se na Joubert da Leem Lubany e foi uma aposta ganha), boas interpretações do elenco na globalidade e, sobretudo, a dimensão proporcionada às personagens fazem de “Condor” uma das séries a não perder em 2018.
Gostei bastante e não vou dizer mais que GoT tem matança. 🙂
Fica por aqui ou vai haver segunda temporada?
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Haverá segunda. Foi confirmada em Julho.
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