Crónicas (T4): Alargar os horizontes

A idade traz-nos uma outra, digamos, sabedoria. O avançar dos anos marca a nossa maneira de pensar ou agir sobre determinado assunto. Aos 40, olhamos para o nossa versão de há 20 ou mais anos e coramos de vergonha (ou continuamos a fazer tudo igual, também dá certo às vezes). E nesta viagem de aprendizagem pessoal a televisão desempenhou (e continua a desempenhar) um papel importantíssimo.

Tudo começou nos longínquos anos 80 (vá! O flashback não vai ser muito longo) e as minhas visitas ao video-clube ou ao cinema. Este último não mostrava tudo o que me interessava ou chegava com quase 2 anos de atraso (o custo da insularidade paga-se de várias maneiras). O primeiro era por vezes uma seca para arranjarmos o filme que queríamos e por isso levávamos muitas vezes com filmes de produção D, E ou Y. „Ai queres o Top Gun? Olha tenho aqui um filme com aviões também e é tudo parecido“. Não era, claro! „Queres ver o Rambo? Leva aqui o XPTO que isto é porrada sem fim e já percebi que é isso que queres“. Pondo de parte estes conselhos que rapidamente deixei de seguir (uma pessoa aprende com o tempo, lá está), a verdade é que foi pelo cinema que comecei a alargar os meus horizontes.

Fossem temas fracturantes (a pena de morte, por exemplo) ou simplesmente uma outra perspectiva sobre momentos históricos (a guerra do Vietnam, por exemplo) a minha visão sobre o mundo foi gradualmente sendo expandida conforme aquilo que via. Onde antes não havia uma opinião, passou a haver uma. Onde antes havia uma intransigência da minha parte, passou a haver alguma flexibilidade. Onde antes havia admiração por pensar que tudo o que vinha dos EUA (em termos de leis, direitos, etc) era sagrado, passou a haver um „afinal não é tudo bom“. Decididamente a minha juventude não teria tido a mesma maturidade se não me tivesse dedicado a ver filmes sobre temas complexos. O entretenimento ensinou-me muita coisa.

Com os anos, o cinema passou a entregar-me menos desta „sabedoria“ e a TV mais. Seja porque os temas não aparecem com a regularidade que deviam ou porque o suporte por vezes não permite uma exploração adequada em termos temporais, nos últimos 10-15 anos, tem sido a televisão a alargar os meus horizontes com mais frequência. Há séries (e documentários e mini-series) com fartura (nunca houve mais) e uma variedade de temas que nos tiram da nossa zona de conforto. A escolha é imensa e acabamos por sempre encontrar com relativa frequência algo que mexe connosco. Algo que nos faz pensar e talvez até mudar de opinião sobre algo. Ou simplesmente ver o assunto de outra perspectiva. E sem este constante desassossego televisivo a vaguear, certamente que seria mais „quadrado“. O cinema, primeiro, e a televisão ultimamente, tornaram-me uma pessoa melhor.

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